Vai se institucionalizando uma campanha permanente de “desconstrução” do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, agora que ele não tem mais o palanque presidencial para se contrapor a uma mídia que acredita que pode prestar ao que sobrou da oposição o serviço que, por mais que tentasse, não conseguiu prestar durante os últimos oito anos.
A institucionalização dessa campanha de destruição de imagem do ex-presidente pode ser vista no furioso noticiário, em novelas e até em programas humorísticos. Insultos, desqualificações, acusações, ridicularizações invadiram tevês, rádios, jornais, internet.
Como sempre, a oposição fica quietinha, deixando à mídia a missão de desmoralizar o ex-presidente que ambas acreditam que tentará voltar ao poder em 2014 ou em 2018, preocupação da direita que lhe insinua certa patologia psicológica por tentar desconstruir hoje um político que, como qualquer um de nós, pode nem estar vivo daqui a 4 ou a 8 anos.
Todavia, não falta consciência dos fatos à direita. Muito pelo contrário: ela sabe muito bem o que está tentando. A destruição do mito Lula é imperativa, para que o povo deixe de acreditar que a política pode lhe mudar a vida “rapidamente” – em termos históricos, oito anos são um piscar de olhos.
A desigualdade brasileira foi construída sobre a premissa do topo da pirâmide social de que seria impossível redistribuir renda rapidamente. O processo demoraria décadas e se daria através do maior enriquecimento dos já muito ricos, de forma que as migalhas acabariam transbordando da mesa do banquete deles.
Lula, em seu governo histórico, provou o contrário. Chegamos ao fim de seu período com um processo intenso de distribuição de renda, ainda que muitos tentem, em vão, desmentir que a renda tenha se desconcentrado no Brasil nos últimos anos, apesar das evidências que caem sobre as cabeças de todos diariamente.
O aumento da participação da renda do trabalho assalariado em relação ao Produto Interno Bruto não deixa dúvidas, mas os pistoleiros da direita na imprensa não param de construir teses malucas que questionam o fato mesmo com eles saltando aos olhos, com aqueles que sempre estiveram alijados do mercado de consumo mergulhando nele de corpo e alma.
O colunista da Folha de São Paulo Clóvis Rossi, por exemplo, há anos trava uma luta inglória no pouco tempo que dedica ao trabalho, com suas coluninhas (agora semanais) na página A2 do jornal nas quais diz que os métodos de aferição da distribuição da renda não contemplam o caixa 2 dos muito ricos e que, por isso, a distribuição de renda propalada seria “lenda”
A tese de Rossi é tão estapafúrdia que não valeria a pena comentar se não fosse o fato de que ainda há formadores de opinião que dão bola a um panfleto partidário como a Folha. Por isso, o presidente do Ipea, Marcio Pochmann, no caderno “Ilustríssima” do jornal, no último domingo, teve que rebater tese tão absurda.
Para resumir, Pochmann deixou claro que os ricos não passaram a ocultar rendimentos hoje e explicou que a comparação, portanto, tem que ser feita entre os indicadores oficiais de hoje e do passado – indicadores como, por exemplo, o índice de Gini.
Esses indicadores com os quais o presidente do Ipea esgrimiu mostram que a renda se concentrou fortemente após o golpe militar de 1964 e permaneceu concentrada, quase sem se mexer, até 2005, a partir de quando começou a se desconcentrar de forma tão intensa que já é possível ver os efeitos, com a classe C virando maioria da população.
É preciso destruir o que Lula representa, pois. Ou seja: destruir a crença popular que a sociedade veio construindo nos últimos anos de que é possível sonhar com um país menos desigual não só para os netos de nossos netos, mas para os que vivem hoje.
Lula representa esse conceito que vai de encontro à mentalidade que permitiu que o Brasil chegasse a ser, ao fim do século XX, o terceiro país mais desigual do mundo, quadro que só começou a melhorar de verdade ao fim do primeiro mandato do ex-presidente, com seus investimentos imensos na inclusão social.
Há uma aposta da direita de que Dilma Rousseff ficará encolhidinha no Palácio do Planalto até 2014, sem incomodar a elite étnico-financeiro-midiática, prontinha para ser derrotada pelo golden boy conservador de turno. Acha isso por prever que a presidente da República não assumirá a liderança política que seu cargo impõe e, assim, será facilmente derrotada.
Contudo, a debilidade eleitoral de Dilma daqui a quatro anos depende da destruição moral de Lula e de sua obra, para que ele não tome o lugar da sucessora na sucessão dela ou para que não volte a avalizá-la eleitoralmente com o sucesso que teve no ano passado.
É nesse ponto que espanta o imobilismo do PT e do próprio governo Dilma diante da campanha difamatória contra o ex-presidente, campanha que a mídia intensificou após ele deixar o poder, no último dia primeiro.
Claro, Dilma não tem nem um mês de governo. Mas e o PT? O partido de Lula não rebate os ataques a ele, à sua família, os deboches, a difusão de uma “herança maldita” que ele teria deixado para a sucessora, teoria tão absurda que não resiste a cinco minutos de análise séria por gente que entenda do traçado.
O governo Dilma não quer marola agora. Vem aí a escolha dos presidentes da Câmara e do Senado, por exemplo. São postos–chave para o governo. Resta saber, apenas, se é inteligente a estratégia de deixar que tentem destruir o legado de Lula e que construam um clima de medo do futuro por conta da tal “herança maldita” que tentam criar.
O debate político é atemporal e não-circunstancial. É perene. Fugir dele já se mostrou um erro – no primeiro turno da campanha eleitoral de 2010. Tudo bem que não estejamos mais em campanha eleitoral, mas como já vi a mídia destruir políticos que durante o mandato foram populares, penso que o PT deveria refletir sobre uma reação a esses ataques.
Fonte: Blog da Cidadania
Fonte: Blog da Cidadania