os dois motivos de comoção nacional e de hipocrisia coletiva
Eu era um pouco mais jovem mas lembro-me bem de ter visto na tv uma reportagem em que uma jornalista (não me lembro bem seu nome, mas acho que ficou famosa depois) estava entrevistando uma família em pleno auge da seca no Nordeste. Na casa, de taipa, uma senhora magérrima, apresentando mais idade do que realmente tinha, mostrava o prato daquele dia: um pouco de feijão sendo cozido em uma água escura, enquanto algumas crianças, igualmente magras, seminuas e sujas esperavam. Lá pelas tantas, a reporter não suportando o quadro de miséria que se lhe apresentava desatou em prantos em plena reportagem, não sei se ao vivo. Pronto. Foi o suficiente. Tomado de grande comoção, o país começou uma grande campanha de doações. Foram milhares de toneladas de alimentos, roupas, políticos dando entrevistas, governadores e presidente falando com voz embargada, a reporter voltando ao local para entregar os alimentos à família melhor apresentada. Foi uma festa. Passada a febre, a seca e a fome continuou a dizimar famílias como aquela ao longo de décadas e os mesmos deputados se reelegendo, os mesmos senadores contruindo currais eleitorais e os mesmos governadores querendo ser presidentes. Nada de concreto foi feito para resolver a situação da seca no Nordeste. O presidente Lula fez a sua parte tirando a dependência dos pobres com relação aos políticos com o Bolsa Família, com geração de empregos e com algumas obras estruturadoras no Nordeste, como a transposição do São Francisco, que divide opiniões, mas que pelos menos gera empregos
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Mas por que estou contando esta história? Por causa do depoimento da professora Amanda Gurgel na AL do Rio Grande do Norte, que está bombando na internet. Depois disso já assisti a uma entrevista da professora no RN TV (acho que é a rede globo de lá) e uma chamada para o Domingão do Faustão. O depoimento da professora apesar de sincero, verdadeiro e espontâneo é a reporter chorando. O País será tomado de grande comoção e eu não preciso dizer o que virá a seguir, basta ler o parágrafo anterior. Mas tal como o desfecho naquela ocasião, quando a febre passar esquece-se tudo e a professora Amanda voltará a pegar seus inúmeros ônibus e a comer o seu cuzcuz alegado. Estou a vinte anos na educação e a quatorze na rede pública de Pernambuco. Conheço bem a angústia da professora Amanda porque ela é minha e de milhares de colegas aqui neste estado e no Brasil. Nada tem sido feito para mudar a caótica situação da educaçao no país e nada será feito. No meu estado enquanto o governo vai a televisão propagandear que é o estado que mais cresce no país, se nega a dar aumento de salário e se resume a pagar o Piso Nacional, embora atrasado, pois o novo valor está em vigor desde janeiro e o governo diz que pagará, se pagar, em junho. O que está acontecendo agora será bom apenas para a colega Amanda, que através da sua indignação e de sua ótima oratória conquistará, por tabela, os seus merecidos minutos de fama.