segunda-feira, 25 de março de 2013

RETRATOS E RECHEIOS




Com o governo Dilma pilotando 92% de aprovação entre ótimo e regular – constatado pelo Datafolha, mas omitido na primeira página do jornal de domingo –, o conservadorismo enfrenta dificuldades para explicitar o que quer com o Brasil.

Para fazer o que pretende, necessita parecer o que não é. 

Daí o frisson que o nome de Eduardo Campos provoca nos seus representantes. Caso, por exemplo, dos correligionários do candidato da derrota conservadora, José Serra, e dele próprio.

Ademais de enfraquecer Aécio, enxerga-se em Campos um ‘cavalo de Tróia’ , capaz de conduzi-los ao poder, sem dar muito na vista.

A manobra requer sangue frio.

Ferir Aécio e fortalecer Campos aliando-se a ele, mas sem expô-lo demasiado para não alertar o eleitor, exige uma mistura difícil de estardalhaço e discrição.

A porta-voz de Serra lotada nas páginas do diário dos Frias tem se encarregado alegremente de sassaricar pelos salões cantarolando o novo bloco. 

Diante dos primeiros relinchos da operação, a colunista classificou, neste domingo, como ‘lance genial’ a aproximação entre Serra e Campos – não por acaso noticiada por ela, em primeira mão, dois dias antes.

Especialista em ambiguidades, coube ao senador Jarbas Vasconcelos, o peemedebista mais tucano do país e principal porta-voz de Serra no Nordeste, colocar contrapesos na folia.

O senador oferece a Campos pilotar um eufemismo habilidoso, que, no entanto, encerra também a confissão de um limite: ‘dissidente’.

Vender o governador na feira dos votos como a costela boa que se descolou de um corpo exaurido é a receita prescrita pelo principal embaixador do neto de Arraes na coleta das adesões.

‘Ele participou disso aí, reconhece que houve avanços, mas acha que poderia ter avançado muito mais’, pontificou no jornal ‘Valor’.

A dificuldade, ou o limite, começa aí. 

‘Mais’ quando ecoado de certas goelas soa como menos.

A do senador está comprometida com preconceitos de beligerância destrutiva em relação ao Bolsa Família, por exemplo. 

“É o maior programa oficial de compra de votos do mundo”, esgoelou, em 2009, o agora principal cabo eleitoral de Campos no Nordeste. 

A região reúne 51% dos 13,6 milhões de famílias beneficiadas pelo programa. 

A declaração do senador foi dada então à revista à ‘Veja’, como parte de um esforço para se credenciar como vice de Serra na disputa presidencial perdida pelo tucano em 2010.

O trecho de sua entrevista: 

“O Bolsa Família é o maior programa oficial de compra de votos do mundo. Há um benefício imediato e uma consequência futura nefasta, pois o programa não tem compromisso com a educação, com a qualificação, com a formação de quadros para o trabalho. Em algumas regiões de Pernambuco, como a Zona da Mata e o agreste, já há uma grande carência de mão-de-obra. Famílias com dois ou três beneficiados pelo programa deixam o trabalho de lado, preferem viver de assistencialismo. Há um restaurante que eu frequento há mais de trinta anos no bairro de Brasília Teimosa, no Recife. Na semana passada cheguei lá e não encontrei o garçom que sempre me atendeu. Perguntei ao gerente e descobri que ele conseguiu uma bolsa para ele e outra para o filho e desistiu de trabalhar’.

“Esse é um retrato do Bolsa Família”, sentenciou Jarbas Vasconcelos.

E esse é um recheio que fará de Campos algo mais próximo de um pastelão udenista, do que propriamente um Cavalo de Tróia demolidor, como sonham os conservadores. 

Em tempo: ao contrário do que pontifica o senador, a frequência escolar das crianças e adolescentes de famílias beneficiadas pelo programa que ele fuzila é uma das condicionalidades da transferência do benefício. Na faixa entre 6 e 15 anos a frequência escolar mensal mínima requerida é de 85% da carga horária. No caso dos estudantes com idade entre 16 e 17 anos, o comparecimento mínimo é de 75%.

Cerca de 15,4 milhões de crianças e adolescentes estavam sendo acompanhados no ano passado. Delas, 14,7 milhões cumpriram a frequência mínima exigida pelo governo: cerca de 86% do total. Em 2011 a taxa havia sido de 85,9%. Pernambuco, por sinal, é um dos estados com um dos desempenhos mais elevados.



Postado por Saul Leblon às 19:3

Fonte:  Carta Maior
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