quinta-feira, 4 de outubro de 2012

A POLITIZAÇÃO DO MPF, DE LUIZ FRANCISCO A GURGEL



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Nos anos 90, insurgi-me contra a politização do Ministério Público Federal. No governo Itamar, tive algumas pinimbas com o procurador geral Aristides Junqueira.  Até por efeito da Constituição, foi um período de protagonismo de procuradores da base do MPF.
Combati o excesso de politização de alguns procuradores, a gana por condenar a qualquer preço, a exposição exagerada à mídia, o abuso dos pedidos de prisões preventivas.
Em uma lista de procuradores, fui atacado por uma das mais radicais - que, curiosamente, dois dias antes estivera em minha festa de aniversário. Entrei na lista para discutir e recebi, em privado, email de uma procuradora narrando sua história. Dois procuradores foram até o Correio Braziliense e passaram, em off, intrigas contra ela. Saiu a matéria. Com base na sua própria denúncia (anônima), ambos entraram com uma representação junto ao Conselho Nacional do Ministério Público.
Comprei sua briga.
Tempos depois, participei de um debate no Observatório da Imprensa com o procurador Celso Três - que fez um bom trabalho na CPI do Banestado, mas que não podia ver um repórter na sua frente para desandar a falar.
Para rebater minhas críticas, Celso Três montou a seguinte equação:
Eu havia defendido determinada procuradora.
No cargo de interina da Procuradoria Geral, ela havia autorizado a liberação da última verba para o Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, beneficiando o empresário brasiliense Luiz Estevão.
Logo, eu estaria fazendo a jogada de Luiz Estevão.
Agradeci a Alberto Dines o fato de permitir, ao vivo e em cores, a demonstração didática das críticas que fazia ao MPF. E, graças ao Três, pude entender a lógica de ilações dos repórteres de polícia que comiam nas mãos de delegados e procuradores como ele. Aliás, a peça do PGR mostra à farta o exercício das ilações na montagem da acusação.
A Sisbin
Quando Márcio Thomas Bastos lançou a Sisbin (Sistema Brasileira de Inteligência), juntando todos os órgãos fiscalizadores (MPF, PF, BC, Receita etc) convidou-me para uma das palestras de abertura, justamente para explicitar as críticas que fazia às investigações do MPF e da PF.
Critiquei, até com muita dureza, admito. Falei do caráter pouco técnico das investigações, do desconhecimento dos meandros das operações financeiras, do fato de se jogar para a plateia e não para os autos. Tive que sair antes do final da cerimônia, para voltar a São Paulo. Mas, na saída, recebi um olhar de aprovação do procurador geral Claudio Fonteles e do diretor geral da PF, Paulo Lacerda.
As perdas com a politização
A politização dos procuradores causou dois males pesados ao MPF.
Na ida, o de comprometer a imagem das investigações, tirar o caráter republicano e assumir um aspecto vingativo, de guerra de grupos.
Na volta do pêndulo, o de tirar toda a proatividade dos procuradores, em suas missões, com receio de ficarem estigmatizados.
Tome-se o caso do procurador de Guarulhos, Matheus Baraldi Magnan. Fez um fantástico trabalho conseguindo do governo de São Paulo um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para reduzir as mortes provocadas pela PM paulista.
Recentemente, recebeu condenação absurda do Conselho Nacional do Ministério Público, com a ameaça inconstitucional de perda do cargo, por ter dado uma entrevista sobre determinado episódio. O relator do caso foi um procurador estreitamente ligado a Demóstenes Torres.
Com esses movimentos, burocratizou-se o trabalho de muitos, inibiram-se as iniciativas de procuradores, para não ficarem marcados como Luiz Francisco - o valoroso procurador que correu risco de vida em muitas investigações mas se perdeu pelo excesso de protagonismo. E transferiu-se a iniciativa política para a cúpula do MPF, o que passou a exigir Procuradores Gerais muito mais centrados e comedidos, sem a submissão ao Executivo - como Sepulveda e Brindeiro -, mas sem extrapolar do papel do MPF.
Politização e perda da isonomia
Agora, dentro desse movimento de politização da cúpula, o Procurador Geral Roberto Gurgel atropela o trabalho iniciado por Fonteles e volta a politizar o MPF. de forma muito mais grave, porque comandada pela cúpula.
Tem-se um caso grave a ser julgado, o do mensalão. O PGR cercou-se de um grupo de elite do MPF para mudar a própria jurisprudência penal através do Supremo.
Trata-se de tema dos mais delicados, pois criminaliza práticas políticas históricas de forma unilateral, penalizando apenas um partido, sendo que há um enorme acervo de abusos por parte de todos os partidos.
Os defensores de Gurgel poderiam argumentar que calhou do PT ser o primeiro a ser julgado. Sim, mas pelo mesmo colegiado, o STF, que autorizou o desmembramento do mensalão do PSDB. Ali, quebrou-se a isonomia.
E se Gurgel não pode estabelecer a isonomia no processo legal - já que o do mensalão do PT caminhou à frente -, caso fosse um agente público responsável, se eximiria das declarações jornalísticas ou, ao menos, trataria isonomicamente a questão nas suas entrevistas.
Não é o que ocorre. Por mágoa contra ataques sofridos, ou por intenção expressa de instrumentalizar politicamente o órgão, Gurgel tornou-se um agente midiático seletivo, trancando iniciativas contra o senador Demóstenes Torres e tantos outros parlamentares, e,  não se contenta em cumprir sua missão, de batalhar pela condenação dos implicados no mensalão, mas quer ir além: atuando politicamente fora dos autos..
A iniciativa de divulgar no site do MPF uma história em quadrinhos sobre o mensalão é de uma imprudência apenas explicada pela arrogância. Assim, como as declarações sucessivas de que quer prisão imediata dos envolvidos.
Qual a razão de dar essas declarações, insuflando a mídia, dando carne aos leões, e não restringi-las aos autos?
Dia desses conversei com um dos procuradores que trabalham no processo do mensalão. Defendeu acerbamente o trabalho do MPF. E admitiu que a condenação mais problemática seria de José Dirceu, por insuficiência de provas. Aí vem Gurgel usando escandalosamente a mídia para pressionar o STF a aceitar seus argumentos. Da mesma maneira que faziam Luiz Francisco e seus companheiros.
Há algo de errado no MPF. Ao mesmo tempo em que se consolida a atuação vibrante em defesa dos direitos humanos, contra toda forma de discriminação, que se legitima como autêntico defensor dos interesses difusos, tem-se uma cúpula que avança além dos chinelos para interferir na vida política do país atuando fora dos autos.


TEORIA DO DOMÍNIO DO FATO NÃO DIMINUI A NECESSIDADE DE PROVAS CONTRA DIRCEU


Saiu na Folha (*):




É POR ISSO QUE BARBOSA GASTA TANTO TEMPO FALANDO DE REUNIÕES, DE DEPOIMENTOS, DE VIAGENS

PEDRO ABRAMOVAY
ESPECIAL PARA A FOLHA

Alguns comentaristas sobre o mensalão passaram a divulgar a ideia de que a utilização de uma nova teoria pelo Supremo Tribunal Federal será definitiva para a condenação de José Dirceu: a teoria do domínio do fato.

Com ela, não seriam necessárias provas do envolvimento de Dirceu. Bastaria seu cargo de chefe da Casa Civil.

A teoria do domínio do fato surge porque era necessário rever conceitos de um direito penal construído final no século 19, em função do aparecimento de uma criminalidade que envolvia mais organizações complexas como empresas ou o Estado.

Assim, se o direito penal clássico exigia que, para condenar o mandante do homicídio era necessário que se provasse que ele determinou que alguém cometesse aquele crime, as situações novas exigem outra abordagem.

O presidente de uma empresa poderia dizer que quer que os seus funcionários cometam ilegalidades para aumentar os lucros e que vai relaxar os mecanismos de fiscalização para isso.

O direito penal clássico teria dificuldade de dizer que o presidente praticou o crime junto com seus funcionários.

Para a teoria do domínio do fato, se o presidente da empresa sabia dos crimes, tinha o poder de realizá-los ou impedi-los e sua vontade foi importante para que fato criminoso acontecesse, ele também pode ser condenado.

Assim, no caso de José Dirceu, o que deve ficar claro é que a decisão de aplicar a teoria do domínio do fato não diminui em nada a necessidade de apresentar provas da sua participação no crime.

Provas de que ele sabia, de que tinha poder sobre os atos e de que sua vontade foi fundamental para o acontecimento dos crimes.

É por isso que o ministro Joaquim Barbosa, mesmo fazendo referência à teoria do domínio do fato, gasta tanto tempo falando de reuniões.

Porque, ainda bem, não inventaram, até agora, nenhuma teoria capaz de autorizar a condenação sem provas.

PEDRO ABRAMOVAY é professor da FGV Direito Rio. Ele foi secretário nacional de Justiça do governo federal no segundo mandato do ex-presidente Lula.



(*) Folha é um jornal que não se deve deixar a avó ler, porque publica palavrões. Além disso, Folha é aquele jornal que entrevista Daniel Dantas DEPOIS de condenado e pergunta o que ele achou da investigação; da “ditabranda”; da ficha falsa da Dilma; que veste FHC com o manto de “bom caráter”, porque, depois de 18 anos, reconheceu um filho; que matou o Tuma e depois o ressuscitou; e que é o que é,  porque o dono é o que é; nos anos militares, a  Folha emprestava carros de reportagem aos torturadores.
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