segunda-feira, 20 de agosto de 2012
Sobre a Petrobras
Suely Caldas - O Estado de S.Paulo
Alvo de críticas e ataques à sua gestão, o ex-presidente da Petrobrás (sic) José Sérgio Gabrielli veio a público se defender, em entrevista publicada neste jornal na quarta-feira. A mudança de diretores e a revisão de metas irrealistas e de investimentos apresentados por sua sucessora no plano estratégico da empresa (na verdade, um choque de realidade) suscitaram dúvidas em relação à sua gestão. Acusado de deixar esqueletos que Graça Foster começa a desmanchar, o futuro candidato do PT ao governo da Bahia decidiu falar e dar sua versão sobre os fatos. Não convenceu.
Nem poderia. Sua candidatura morreria antes de nascer, se ele identificasse a verdadeira causa dos problemas: a intensa crise de confiança vivida pela estatal, sobretudo nos oito anos do governo Lula, dos quais Gabrielli esteve à frente da gestão por cinco anos e meio. Essa crise, que atende pelo nome de "interferência política nos negócios", produziu um custo muito alto para a Petrobrás (sic) e seus acionistas e frustrou os brasileiros com o orgulho pela empresa abalado.
Um breve resumo dos estragos: entre agosto de 2008 e dezembro de 2011, o valor de mercado da Petrobrás (sic) caiu de US$ 303,6 bilhões para US$ 155,4 bilhões, um tombo de quase 50%. Recentemente, ela perdeu para a colombiana Ecopetrol o título de maior empresa da América Latina. Desde 2010, perdeu para a Vale outro título, o de maior exportadora do Brasil. E, no balanço do trimestre abril/junho, amargou o primeiro prejuízo em 13 anos.
Feitos também ocorreram na gestão Gabrielli. Afinal, com competência técnica, geólogos e engenheiros escreveram e continuam escrevendo uma história de sucesso para a Petrobrás (sic) ao longo de seus 58 anos. O maior feito foi a descoberta de jazidas gigantes de óleo por onde se estende a rocha salina do pré-sal. Na verdade, a presença de óleo abaixo da rocha já era conhecida dos geólogos desde 2001. O desconhecido era ali existirem reservas gigantescas e que começaram a ser dimensionadas em 2006.
Mas a marca da ruinosa interferência política nos negócios da estatal começou a surgir depois que Lula tomou posse, em 2003. Aliás, o ex-presidente não se preocupou em esconder sua intenção, escancarada no episódio da demissão do físico Luiz Pinguelli Rosa da presidência da Eletrobrás: "Que me desculpe o Pinguelli, mas ele não tem um só voto no Senado", justificou Lula. E o substituiu por Silas Rondeau, apadrinhado do senador José Sarney.
Nas diretorias da Petrobrás (sic) fez o mesmo. Partidos da base aliada aliciavam funcionários da estatal e Lula os nomeava. Abortado o mensalão em 2005, Lula reforçou o uso de cargos públicos na barganha com a base aliada. Fez isso com todas as estatais. O resultado em desvios de dinheiro e outras práticas corruptas pode ser percebido pela faxina que Dilma Rousseff apenas começou.
Depois que Graça Foster anunciou a revisão do plano estratégico e trouxe números, metas e investimentos à realidade, as ações da Petrobrás (sic) reverteram a queda na Bovespa e começaram a valorizar. Mesmo depois de anunciado o prejuízo de R$ 1,346 bilhão do balanço.
A substituição de diretores políticos por funcionários escolhidos por mérito; o reconhecimento no balanço da sangria (não revelada por Gabrielli) de R$ 2,7 bilhões aplicados em 41 poços secos ou improdutivos; o reajuste de preço de derivados há anos congelados e fonte de prejuízos crônicos; e o adiamento ou cancelamento de investimentos políticos, cuja localização Lula definia com governadores amigos, são fatos concretos que Graça Foster apresentou ao mercado - com o compromisso de não repeti-los - para tentar derrotar a crise de confiança, a descrença em relação a uma gestão de qualidade técnica no futuro e que contribuíram para valorizar os papéis da estatal.
Com o respaldo de Dilma Rousseff, Graça tem sinalizado que vai resistir às demandas de interesses e maus negócios propostos por partidos aliados do governo. Resistência que Gabrielli não mostrou. Pelo contrário, em 2006, ele próprio apareceu em programa televisivo do PT aproveitando-se do cargo de presidente da Petrobrás.(sic)
JORNALISTA, É PROFESSORA DA PUC-RIO E-MAIL: SUCALDAS@TERRA.COM.BR
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Carta-resposta de José Sérgio Gabrielli a Suely Caldas
Prezado Editor,
Prezada Suely Caldas
Respeitando inteiramente seu direito de opinião, gostaria também de ter direito de discordar e emitir minha opinião contraria sobre o artigo assinado e publicado no Estado de São Paulo de hoje, 19/08/2012, pagina B2, em que sou mencionado várias vezes.
De acordo com Suely Caldas, parece que a Petrobras viveu uma intensa crise de confiança, durante os oito anos de gestão de Lula na presidência da Republica e o tempo que fiquei na direção da Petrobras. O preço de um titulo PBR, equivalente a ações da empresa no mercado de NY, saiu de 3,67 dólares em 31/12/2002 para 55,31 dólares em 1/08/2008, aumentando 15 vezes, até que veio a crise de 2008. Mesmo depois da crise, em finais de 2011, o valor da PBR era US24,67, o que equivalia a 6,7 vezes o seu valor de antes do tempo em que a equipe indicada pelo presidente Lula assumisse a direção da companhia em 2003.
Ela diz que entre Agosto de 2008 e Dezembro de 2011 o valor de Mercado da Petrobras caiu quase à metade devido, segundo ela, a “interferência política nos negócios”(sic). De acordo com a nossa prestigiada analista econômica e politica essa seria a principal causa da “intensa crise de confiança vivida pela estatal”.
Vamos aos fatos:
1. A chamada crise não parece se manifestar na opinião dos analistas do mercado financeiro que acompanham a Petrobras. De acordo com a empresa, no seu site público, nenhum, repito nenhum, dos analistas de 21 corretoras que negociam ações no Brasil e das 18 que negociam no exterior, recomenda a venda de ações da empresa. Nenhum analista!
2. No mesmo período mencionado pela autora o valor do real caiu de 1,55 reais por dólar para 1,87 reais por dólar. A conta da Doutora Suely Caldas deixaria de ser uma perda de valor de mercado em dólares de 48,8%, para ser uma queda de 38% do valor de mercado em reais. Esses 10% de diferença não têm nada a ver com a causa suposta pela autora.
3. O preço do petróleo internacional, elemento fundamental para a precificação do valor de mercado das empresas petrolíferas, estava em 124,1 dólares em final de julho de 2008, caiu para US$35,82 em finais de dezembro de 2008, atingindo 108,9 dólares em dezembro de 2011, o que significa uma perda de 12% de valor internacional do barril de Brent associado a variação dos preços externos. Não me consta que o preço internacional do barril de petróleo tenha a ver com a interferência política de Lula na Petrobras.
4. Todas as empresas do mercado de ações do mundo sofreram perdas decorrentes da crise financeira posterior a queda do Lehman Brothers, que pediu concordata em 15/09/2008. Isso também não foi causado por influencias politicas na Petrobras.
5. A comparação com a Ecopetrol e com a Vale é uma mistura de empresas completamente dispares em seus ciclos. A Ecopetrol, uma empresa colombiana com forte base em petróleo onshore, iniciando seu processo de entrada no mercado de capitais e a Vale, uma grande exportadora de minério de ferro, que tem seu valor altamente correlacionado com o preço dessa mercadoria, com vendas internas muito pequenas em relação ao seu faturamento total. O movimento dos seus valores de mercado têm muito mais relações com o momento do ciclo de cada uma de suas mercadorias em relação ao Petróleo, do que a comparação entre as gestões das empresas.
6. Foi o ciclo de expansão das expectativas sobre as perspectivas de crescimento da produção offshore da Petrobras a principal razão do descolamento do crescimento de seu valor de mercado anterior a 2008. A grande valorização o anterior à crise, a enorme capitalização (a maior da história do capitalismo) da empresa em 2010 e o melhor conhecimento sobre as realidades do gigantesco potencial do pré-sal ajustaram as expectativas e colocaram ancoras na elevação do valor de suas ações, durante a recuperação pós Lehman Brothers. Nada disso foi influência da política brasileira.
7. Segundo a Doutora Suely Caldas os efeitos da “ruinosa interferência política”(sic) do Presidente Lula sobre a Petrobras foram muito nocivos para a empresa. De acordo com apresentação da Presidente Graça Foster, no 13o. Encontro Internacional da FIESP, em 7/08/2012 o Brasil cresceu sua produção de petróleo de 73% de 2000 a 2011, durante o período nefasto à la Suely Caldas, contra um crescimento mundial de 12%. A produção de gás cresceu 61% contra 36% do mundo, as reservas cresceram de 73% contra 38% do mundo.
8. Entre 2000 e 2011, o Brasil cresce 729% de capacidade de geração de energia a Gás Natural, 124% a energia a óleo e atinge 1,3 mil MW de capacidade de geração de energia eólica. Em todo esse crescimento, o papel da Petrobras foi fundamental.
9. A Petrobras construiu parcerias com mais de 120 universidades e centros de pesquisa no Brasil, pais que está vivendo uma extraordinária expansão do seu mercado de derivados de petróleo. Durante o período “ruinoso” segundo a autora do artigo, de Lula e da Presidenta Dilma, de 2000 a 2011, o mercado de combustíveis, que vinha de uma longa estagnação, se acelera. De acordo com dados da presidente Graça, a demanda de gasolina subiu 49% no período, contra uma expansão mundial de apenas 15%. No diesel, a diferença entre o Brasil e o mundo é de 43% a 29%, no QAV foi de 53% e -2%. Crescimento econômico, distribuição de renda e boa politica econômica sob o comando dos dois presidentes é o que explica essa diferença.
A Doutora Suely Caldas perdeu a objetividade por causa de seus preconceitos ideológicos. Como toda boa jornalista ela deveria pesquisar um pouco para informar aos seus leitores que, durante os nove anos em que estive na Diretoria da Petrobras, o numero de mudança de diretores foi das menores da história da empresa e sempre com profissionais com reconhecida competência em suas áreas de conhecimento. Eu substitui o presidente Dutra, depois de quase três anos de Diretor Financeiro, o diretor Paulo Roberto substituiu o diretor Manso no Abastecimento, a atual presidente Graça Foster substituiu o diretor Ildo Sauer na Diretoria de Gás e o diretor Zelada substituiu Nestor Cervero na Internacional. Foram somente essas trocas de comando nos nove anos em que estive na direção executiva da maior empresa da América Latina, em um período em que ela viveu extraordinário crescimento.
Todos podem ter a ideologia que quiser. O que o jornalista deve evitar é ser contaminado pela sua e perder a objetividade.
Despedindo-me
Atenciosamente
Jose Sergio Gabrielli de Azevedo
Secretario do Planejamento do Estado da Bahia, professor titular licenciado da UFBa e ex-CEO e ex-CFO da Petrobras.
Fonte: Com Texto Livre
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