A maior novidade da política americana até anteontem era o Tea Party, assim batizado para lembrar um episódio de insubordinação dos colonos à coroa inglesa, em 1773. O protesto original foi contra a tributação escorchante do chá produzido nas colônias e outras arbitrariedades do império e acabou sendo um dos principais antecedentes da guerra pela independência dos Estados Unidos, que estourou três anos depois.
O Tea Party atual é contra aumento de impostos, principalmente para os ricos, a favor de um governo mínimo, contra programas sociais e a favor de um fundamentalismo religioso que condena o aborto e a tolerância com gays — enfim, todo o manual conservador — e contra um poder centralizado e distante, agora com Barack Obama no lugar do rei George III.
Isto foi até anteontem. Hoje a novidade é o movimento chamado Ocupar Wall Street, que se alastra pelos Estados Unidos e lembra as manifestações por direitos civis e contra a guerra no Vietnã de anos atrás.
O movimento americano se parece com os protestos na Europa contra as medidas de austeridade para enfrentar a crise financeira porque a revolta dos dois lados é contra a mesma injustiça básica: quem está pagando pela crise são os que não têm culpa alguma, enquanto os culpados não só não estão pagando como estão ganhando como nunca.
Mas é diferente na medida em que os americanos têm uma Bastilha clara para atacar, mesmo de longe: Wall Street, o coração do capitalismo financeiro e o símbolo mais evidente da injustiça, onde os lucros e as gratificações de executivos crescem em proporção inversa às perdas de renda e de emprego da maioria da população.
O OWS também não pode ser chamado de movimento anti-Tea Party porque ainda não se sabe se vai durar ou ser apenas um espasmo de indignação, enquanto o Tea Party está institucionalizado, já elegeu uma porção de reacionários para o Congresso e influencia todos os candidatos declarados dos republicanos às eleições presidenciais do ano que vem. E o OWS não pode defender o Baraca dos ataques da direita, que o chama de socialista disfarçado, porque também o considera um dissimulado, no caso conservador.
Diz-se mesmo que OWS está nas ruas fazendo o que Obama deveria estar fazendo na Presidência, enfrentando os privilégios de Wall Street e cobrando do mercado financeiro desregulado sua culpa na crise, ou no mínimo um pouco de recato na sua festa.
Mesmo que não dure, o OWS é uma bem-vinda novidade num país em que a direita parecia ter monopolizado o discurso político e a mobilização da rua. A Bastilha não vai cair, claro. Mas é bom ouvir um som novo à sua volta.
Luís Fernando Veríssimo
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